Poeshydra
- URRO
- 23 de nov. de 2022
- 12 min de leitura
Atualizado: 3 de dez. de 2022
Coletivo Bambu: um reduto de poetas e escritores
Em uma mesa de bar, de um reduto de pulso, de arte, de poesia. No Vila Bambu, um encontro de escritas feito por escritoras, escritores e poetas deu origem a mais encontros de escritas, em forma de prosa e de rima. Esse encontro de escritas assina em nome do coletivo.
O Bambu é formado por pessoas que escrevem e que fazem das palavras ferramentas de luta, de posicionamento, de delírio e de possibilidades. São poetas, escritoras e escritores de Campinas e região que se unem com o objetivo de organizar saraus e debates sobre a produção literária do tempo de agora.
O nome Bambu, uma ode à resistência e à flexibilidade, mostra que a literatura persiste e, ao fazer da envergadura trampolim de versos, nascemos.
Aproveite para seguir a página do Coletivo e acompanhar os saraus, que sao mensais no bar Vila Bambu, no bairro Vila Nova, em Campinas. @coletivo_bambu


Política
Emília Souza
a mulher é política
ainda que não se filie a nenhum partido
que tenha sido ensinada a se afastar da política
ela apenas o é
é político levantar os olhos acima do chão
andar de mamilo duro
sob o fino tecido da liberdade
pra além do voto
há política no pulsar da vulva
na cutícula desfeita
na marcha de cara lavada
não se engane mulher
pra nós
que sangramos
não morrer é um ato político
semtempo-semcerne-semvia-semnome
Tina Zani
o vento e eu andamos lado a lado pelas ruas porque passamos os dias tão leves como uma brisa tão fortes como uma ventania a balançar nas árvores nas redes varrer as folhas no chão. o vento e eu entramos lado a lado aqui neste lugar ventoso nestas casas bagunçadas sempre cheias de coisas muitas coisas muitas plantas muita gente muito som muitos pelos muitas folhas espalhadas muito lugar pra todo mundo. o vento e eu nestes quartos muitos quartos e cadeiras muitas casas no quarteirão muitos cachorros na rua bêbados também. a rua é de terra a rua é de asfalto é de paralelepípedo. tem um boteco em cada ponta tem uma pousada pra peões passa boi passa carro passa cavalo. o vento e eu e uma família de cabras papai mamãe e três filhotinhos béééé. tem galos tem pintinhos tem galinhas que botam ovos tem um prédio embargado onde não mora ninguém e tem os patos que moram no prédio e cachorros muitos cachorros. tem gatos. na esquina de cima tem uma igreja a editora fica na rua ao lado. tem casinhas casas chácaras. não tem rio dentro tem rio perto. piracicaba capivari atibaia jaguari vento eu. tem uma serra que é um morrote que é um morro pequeno mas que é alto que é a serra das cabras que é o pico das cabras que é uma serra-pico-monte de urânia que é uma simpática morraria uma divisa natural entre as cidades que orbitam à leste. a serra das cabras na estrada de capricórnio tomada por belos pitorescos graciosos mirantes e rochedos e pedras que parecem a pedra grande de atibaia e o observatório de capricórnio onde o vento e eu muitas vezes nos tocamos. eis aqui um rolê pelo morrote uma aventurinha adrenada na simpática serrinha onde a cidade teima em querer encostar no céu a serra-pico das cabras que de cabra só tem o nome porque as cabras uma família inteira de cabras papai mamãe e três filhotinhos béééé estão no terreno baldio da ladeira aqui de baixo. o vento e eu habitamos lado a lado este lugar. o vento e eu nesta metrópole que tem um bar que se chama metropoly onde muita gente vai beber e jogar jogos que são games mais modernos que são clássicos que marcaram época que são todos liberados para o seu entretenimento. o vento e eu habitamos aqui o parque rural que é uma fazenda que não é mais uma fazenda mas tem nome de fazenda e de parque rural e de uma santa que também é nome de alvejante pra deixar as roupas brancas. esta é a rua. é a rua de um professor. a vizinha é de um arquiteto e aqui perto tem a chácara que é um bairro que é uma chácara e se chama primavera. este lugar onde o vento e eu andamos lado a lado está na microrregião como na mesorregião isto é que têm o mesmo nome rmc distante 99 km a noroeste de são paulo 513 de adamantina 249 de agudos 200 de cajuru 82 de santa gertrudes. aqui onde o vento e eu sempre estamos estivemos estaremos é sempre primavera sempre outono sempre inverno ou verão. mais a primavera o outono o inverno e não o verão. aqui passou uma coisa muito importante. passou enquanto eu vivia por esse lugar. passou enquanto eu também passava. aqui passou alguma coisa importante um vento uma ventania uma brisa um tempo passaram por aqui onde eu vivia mais uns vários dias. estou no meio disso e não percebi nada disso. o nelson o seu marcelino o seu casemiro. o véio do pão que vende pão de noite em todo bar em todo bar em todo bar não interessa que bar que horas quem. em todo bar o véio do pão vai passar tal qual o vento a brisa a ventania o véio sempre vem vender pão quentinho que a patroa dele acabou de fazer. o véio não conhece o nelson. o nelson fuma cigarro barato e abre uma latinha todos os dias às 11h. deu 11h? o nelson abriu a latinha. o nelson varre as folhas do chão com uma vassoura que é uma folha de palmeira enfiada num pedaço de cano cortado que ele mesmo fez porque ele é o cara que faz tudo. o nelson não tem mais nenhum dente na boca porque um dia ele pediu pra arrancar todos. quando o nelson vai comer churrasco ele chupa a carne e dá muita risada com o corpo inteiro. o nelson apagou uma tatuagem que ele tinha com um cotonete molhado em soda cáustica. ele descobriu isso porque um dia pingou soda cáustica na tatuagem e apagou e depois ele apagou também. o seu casemiro era amigo do nelson. ele só andava descalço e já morreu. um dia meu pai levou o seu casemiro no podólogo comprou um sapato pra ele e ele não conseguia mais andar. o seu casemiro chamava meu pai de dr. xanti que era uma gíria que significava que o seu casemiro achava meu pai muito legal muito bacana. o nelson não se dava com o seu marcelino. o seu marcelino plantava pé de planta e já morreu mas não morreu igual ao seu casemiro que morreu atropelado. o nelson está vivo vivinho da silva, mas não toma vacina. eu tentei sair da minha vida e olhar pra ela de longe. eu olhei e vi o vento e eu e o nelson e uma faísca. eu vi a faísca que eu carrego desse lugar que não está mais lá. eu tentei imprimir a imagem dessa faísca e eu olhei e vi a praça na frente do prédio embargado onde não mora ninguém com uma mesa feita de uma árvore caída onde uma vez a sabrina foi fazer um piquenique. porque esse lugar não está mais lá. eu não estou mais lá. o vento eu carrego desse lugar. o vento que me cortava a pele na culto à ciência, que era um tempo dessa terra. mas a gente passa muito pouco tempo na terra e a cidade nunca acaba de ser escrita.
Do lento aprendizado da dor
Lia d’Assis
aprende-se a ser menina
suportando-se
laços de fita
roupas incômodas e bonitas
beijos babosos de tios velhos
(seu tolerado olhar de malícia)
aprende-se a ser menina
sentindo-se errada
sentando-se
com as pernas fechadas
lavando-se a louça
olhando calada
os meninos na rua
as interditas divertidas
alheias brincadeiras
engolindo o choro
na frente das visitas
aprende-se a ser
mulher molhando-se
o rosto em lágrima
em água gelada
a aliviar as olheiras
em água termal
a disfarçar o desgaste
mais da vida
que da maquiagem
aprende-se a ser
fêmea fingindo o gozo
a agradar o macho
fazendo-se infinitos esforços
dietéticos-estéticos-cirúrgicos
comprando-se calcinhas
de tamanhos diminutos
e cores atraentes
deixando-se desejável
e nunca desejante
aprende-se a ser
mãe ainda menina
a embalar bonecas
a brincar de casinha
só com outras mães-meninas
ausência de pais-meninos
encenando o possível
abandono
a lamentável solidão
no cuidado dos filhos
mas no lento aprendizado da dor
acenando insistente vê-se
um alento
o imperativo do fracasso
o desejo de desaprender...
O tempo vira
Armando Martinelli
Você bebe mais um cálice de vinho tinto.
Um vulto acende um cigarro na sacada.
Olhares se multiplicam na espera da próxima rodada.
Observa o quadro envolto em tintas óleo desejo.
Há uma eletricidade na filosofia etílica.
Há uma busca por lábios que citam Deleuze enquanto o Sabiá canta.
O pássaro segue a voltagem da metrópole.
Os pássaros, os indígenas e as línguas possuem capacidades próprias de adaptação.
A mensagem aponta a queda do império.
Desiste de orbitar ao redor da Lua.
A nave não tem (ou jamais teve) trem de pouso.
Que tal um Sarau?
Sempre tem alguém em busca de incêndios maiores.
E sempre tem alguém esperando a faísca incandescente.
Ainda bem que o mundo é assim.
Abre a camisa e lambe o peito entre os versos de Ana Cristina César.
Atrás dos olhos das meninas sérias línguas separatistas causam fissuras de verdade.
A linguagem agora tem outro ritmo.
É maré-saliva.
Não olha para trás.
Sai da frente que essa é uma rasante.
O tempo vira.
Você bebe agora direto da fonte.
Não há outro mundo lá fora.
Até o Sabiá silenciou.
Discurso
Natália Mota
mata, míngua
usa a língua
contra qualquer beijo
contra todo desejo
de vida colorida
das palavras armadas
armaram-se mãos
a céu aberto, saem às ruas
tudo que viveu no porão
tão sutil quanto um corte
com papel sulfite
tão brutal como
explosão de dinamite
sai pela boca suja
rasga só um verbo
em vários tempos
64, 2018, 2022
mas temos outra gramática
na prosa camarada
na poesia de granada
é tudo agora,
pra haver depois
Lucineide
Alessandra Melo
Antes das oito resolvi trinta problemas,
quase mudei de cidade,
inventei uma vida nova inteira.
Risível,
Um sorteio é proposto no aplicativo da educação,
mão que levanta, chat!
Alvorecer de uma nova era, penso,
mais uma vez não concordamos eu e os historiadores.
Cepas novas,
Cercas novas,
Velhas guerras.
E Lucineide não me ouve
por mais que eu grite.
Estudo sobre o silêncio
Daniel Costa
Si-lên-ci-o:
Ausência
Da soada do som e da fala da voz
Si-len-ci-ar:
Ato
De impor, assumir ou causar
Silêncio àquilo que
Soa aquele que fala
Si-len-ci-á-ri-o:
Ofício
De quem assalaria a voz
Para fazer soar o silêncio
E é meu irmão
Si-len-ci-a-ção:
Testemunho
Do silêncio se armando
Sobre si sobre
As gentes e as coisas
Na calada da história
Si-len-ci-á-vel:
Corpo
Da voz que sente
Quando fala
Sangue
Do som que move
Quando soa
Si-len-ci-en-se:
Naturalidade
Lavrada em cartório
Do nascimento no município de Silêncio
Haverá retirantes?
In-si-len-ci-á-vel:
Palavra
Inventada depois da invenção do mercúrio e do ouro e do cromo do trinco e do aço jagunço ou do chumbo da lei e da prata da casa e do níquel do arroz mais o cobre feijão e esse ferro da ordem e as fardas e as valas e que tenta dizer que não importa quantos metais venham abaixo sobre uma garganta
a verdade ressoa dentro
dos ossos quando
alguém pergunta
por ela.
O Brasil é uma árvore
Carol Ruiz
meu país
ibirapitanga
Terra Indígena
em seu sangue
corre a força
dos que persistem
como o tronco duro
e resistente do orabutã
meu país
paubrasilia
Terra de Santa Cruz
nossa época anuncia
a volta ao sentido puro:
Brasil é uma árvore
sua seiva é vermelha
e arde como brasa.
Linha Férrea
Katia Marchese
No trem das Gerais,
o jogo do infortúnio.
Entrega mulheres,
homens e meninos.
A nudez de um lado,
os cabelos do outro.
O pátio gira, gira
toca o infinito.
A palha aninha os corpos.
Insensíveis ao choque,
seguem as horas dos sinos.
Colônia de Barbacena, não sabemos nada sobre isso.
No trem das Gerais,
o jogo do infortúnio.
Entrega ferro, nióbio,
tantalita e manganês.
Lavra a cava,
infiltra o desalmamento.
Choca-da-mata, águia-cinzenta
batem asas ao silêncio.
O peixe salta
no último redemoinho.
Mais dia menos dia, lá vai o Rio.
Mariana, Brumadinho, não sabemos nada sobre isso.
O insuportável contém as portas do esquecimento.
Eu sinto minto
Maryane Camparoni
Não fico na superfície das coisas
Fixo no profundo
Onde mora o fogo, Raquel
Dói tudo
A história do mundo I
Gonzalo Dávila Bolliger
I
Mister Solaris teve um filho
E pediu para Madame Astrolábia que o batizasse.
Ela olhou para o céu infestado de estrelas
Escolheu a que lhe parecia mais bonita
E disse: Ele se chamará Baruch, o filho de Netuno com a lua
O de milhões de palavras, aquele de mil nomes.
Pois será mais forte que todos os homens,
Mais belo e valente que todos os homens,
E em cada vila receberá um nome distinto.
Bebê Baruch era feio e careca,
Aos cinco anos não conseguia falar nem andar
E gostava de bater em seu macaco
Até que o mesmo se transformasse em barata.
“Madame, madame Astrolábia, o que será do nosso filho?”
Falavam o senhor e a senhora Solaris,
E falavam todos os pássaros do céu e todas as bestas da terra.
“Não vemos força nem coragem nele
E nem sabemos como nos dará dinheiro.”
“Acalmem, acalmem a alma” – dizia a lisérgica vidente Astrolábia.
“Tudo o que parece não é, tudo o que é não parece.
Ele é especial como um alienígena com chifres,
Ele é único como um vulcão que solta lava de gelo,
Eu soltarei um cavalo e onde
O cavalo defecar,
É onde Baruch começará a falar.”
No planeta terra Baruch desceu,
Já era um bebê grande e quis que sua prole aumentasse.
Tantas, tantas almas bem dispostas ali encontrou!
Eles estavam sedentos por Baruch, faziam
Templos para Baruch muito antes da sua chegada.
E hoje em dia
Baruch reina, Baruch comanda, Baruch caga e todos obedecem!
II
Como explicar o que é Baruch?
Quantos sábios e tolos
Não passaram a vida tentando compreendê-lo?
Baruch é espírito, é corpo, é espirro?
Baruch está em tudo ou em nada?
Baruch faz sempre o que é certo ou
As pessoas é que traem Baruch? Ou então
Um anti-Baruch estraga suas maravilhosas ideias?
Oh, Baruch criou tudo e foi embora
Ou Baruch ainda está com nós e escreve
O certo em linhas muito tortas? Qual
É a verdade que se esconde entre essas nuvens poluídas?
III
Baruch almeja controlar
Os sonhos e os desejos e as crenças
De todos os homens e formigas que habitam a terra
E manda que homens mascarados
Ameacem aqueles que não respeitam as prescrições do seu livro
Do seu livro-cd composto de peidos, arrotos e choros de bebês.
Ele divide o mundo em uns tais de países
Muralhas de mortos separando os países
Moedas que valem montanhas ou árvores de areia,
Impalpáveis como os sonhos dos mortos.
“Queimem os barracos, as favelas, os mangues
E destruam as florestas para que meus filhos, os grandes
Peidadores do caos
Possam se alimentar como em um piquenique no inferno!!”
É o que berra Baruch enquanto desfila diante dos cagões,
E é isso que muitos repetem em camisas verde-amarelas
Em fardas romanas e em mantos de monge,
E em palácios onde se decide como se deve roubar,
Pois Baruch, ah Baruch
Para a sua sublime satisfação
Tem desde sempre milhões de olhos que rezam por ele
E que sabem que ele é o Deus
O Deus que une o amor e o ódio
E que sabem que ele é o Deus
Que dá o mágico sentido
Para as fantasias jamais concretizadas...
E com aqueles que não rezam ele sabe o que fazer!
Há cavernas especiais chamadas cadeias,
Em volta delas além do deserto não há nada,
Em volta do deserto um mar de latas e cocô,
E nessas cavernas de tantos tipos diferentes
Ele coloca os ateus, as adúlteras, os sábios,
Os gays, os drogados, os guerrilheiros, as putas
Os artistas, os índios, os negros, os eslavos
Os outros deuses que competem com ele
Os que são e sempre serão pobres
E uma tanta infinidade que fica difícil contar...
Ah, cadeias reais, cadeias mentais, cadeias sociais
Cadeias sempre em cada povo iguais e diferentes,
Ele ama todos os tipos de cadeias,
Sua diversão é colocar os inimigos de Baruch nesses infinitos cadeados!
Muitos, é claro, mesmo podendo serem presos se revoltam,
Falam que ele não existe ou que é um filho abortado.
Eles batem panelas, eles saem nas ruas de despovoadas cidades
Eles escrevem livros contra ele ou contra sua existência
Eles criam ONGS, empresas, exércitos, religiões, vazios
Eles ficam deitados reclamando ou bocejando
Ou então gritam das janelas, como se expulsassem os órgãos de dentro:
“Morra Baruch, saia do seu trono de fezes Baruch!”
Mas ele ri e ri sem parar
Pois nenhuma dessas vozes jamais será escutada
Seus peidos são os trovões do purgatório,
Suas risadas os ecos do inferno.
“Baruch é quem manda, Baruch é o bum Baruch é o bo Baruch é o boi bobo!”
E multidões seguem Baruch até o precipício da terra
Até o precipício da terra plana das suas mentes,
E multidões param de viver para dar vida a Baruch
Pois pensam que são do mesmo sangue e substância que ele...
Mas Baruch não é mau
Não, não é isso!
Ele às vezes, deitado em sua elástica cama
Percebe que tem agulhas e gordura no meio dos miolos
Que o impedem pensar sobre tudo ou quase tudo...
Então olha para o céu e sorri
Sorri por uma deusa mais poderosa que ele o ter escolhido
E pensa - ao olhar para suas arminhas de brinquedo
E ao deixar cair baba de suas gordas bochechas -
Bom que para ser Deus só é preciso ter nascido!
E quando está deprimido ele fala morram comigo,
Pois o imperador deve morrer sempre acompanhado,
E assim os próprios servos se enterram ou enterram aos demais.
Cabeças são decapitadas para homenagear o rei sol
Colheitas são garantidas com o sangue inimigo
Uma cabra imolada como oferenda ao deus dos mortos
Bruxas queimadas para abençoar o deus crucificado
Tudo, tudo para deixar ele feliz, ele
O careca, o babento e peidorento Baruch
Aquele com olhos enormes que saem da cabeça
E que rindo dança destruindo os pilares da justiça do caos
“Baruch manda, Baruch é o rei momo!
Baruch só quer o bem, mesmo que tenha
Que fazer sempre o mal!”
Ri Baruch, ri
Ri islante intratável inoperante irrequieto
Ri ilimitante histriônico intolerante ilhado
Ri ri Baruch i i i apenas ri
Pois Baruch manda, Baruch peida, Baruch é o rei momo
Pois Baruch é Baruch, é o bum é o bo é o boi, rei bobo, bobo bum!”
E ele pede para que todos os homens e mulheres
Pintem a pele de uma mesma cor!
E ele culpa os mendigos pela ruína dos reis
E proíbe os da esquerda de dormirem de barriga para cima
E os da direita de comerem porco na lua cheia!
E promove as guerras contra os povos
Que abrem os ovos pela base e não pela ponta
Ou que cortam seus cabelos
Ou que deixam a barba crescer
E em cada país, cidade ou mente
Dá uma ordem diferente
Para que todos com a guerra e o caos se divirtam!
E mesmo assim o mundo venera Baruch.
Quando algo bom acontece
A pessoa sempre grita, “é graças a Baruch!”
E quando fica doente, cego ou sem dentes
“É tudo culpa dos inimigos de Baruch!”
E assim Baruch nunca tem como perder...
Pois Baruch é Baruch, é o bum é o bo é o rei bobo!”
Pois Baruch é Baruch, é o bum é o pum é o bu é o boi bobo!”
Ah, o mundo hoje está feito de cidades em ruínas
Uma seca terrível se alastra incendiando os povoados, corações e sonhos,
A imbecilidade está protegida em uma capsula de metal radioativo
E todos ao olharem as estrelas cobertas de fumaça se perguntam:
Oh, por que com tantos Baruchs pelo mundo
Continuamos assim sem comida sem alma e perdidos em oceanos sem fundo?
Apenas um quadro sem paredes
Maurício Simionato
a lâmpada ainda acesa
desilumina com espinhos
a semiescuridão cor de
sangue pisado, ao fundo
o touro de um olho só
tem a orelha pontiaguda
e seu corpo finda existências,
embaixo de seu queixo
há uma mãe que tenta gritar
porque traz, em seus braços,
fracos de tanto amor,
o desprovido de vida;
o cavalo relincha perdido
sem saber a qual lado serve na luta,
outro rosto surge pálido, de perfil,
se projeta abismado
de terrores, sem ver que
alguém estende as mãos,
dedos sem dono trazem a tocha
que desvela a dor
em semitons cinz’azulados
a espada quebrada reflete
prédios em chamas sob
um cidadão qualquer, sem chão
Ilusão
Roberto Cardinalli
Eu preciso de você agora. Não tenho tempo
Vou dizer apenas uma vez. Presta atenção!
Só tem um jeito de você me ver; é de olhos vendados.
Amar não é para mim; pertence a humanidade.
Para isso, alguém compôs a eternidade
Estamos sempre correndo contra o tempo.
Então corra.
Está frio. Por quê precisam falar de mim?
Eu nunca saio.
Olhe prá mim.
Sei que você está aí. Posso sentir a sua presença.
O que é que vim fazer aqui?
É poético isso?
De alguma forma, sim.
Um dia, seremos par... com outro.
Parece que sempre é assim.
Nossa equação já foi mais complexa.
Fomos os primeiros a ver a chuva ontem. Lembra?
Você voltou? Então voltamos.
Não! Não! Não! Não!
Essa droga é só minha
Não pare de rir.
A morte só é ruim para quem fica.
Ilusão é uma escolha. Escolher é uma ilusão.
Bem bom!